Por favor, pare de ler esse texto se você ainda não é mãe. Provavelmente você não será capaz de compreender o que uma mãe sente no período pós-parto e eu não preciso do seu julgamento.
Não se trata de estar ou não feliz. Não tem a ver com felicidade,
absolutamente. O puerpério, que começa com nascimento do bebê e não tem prazo
para acabar, é um período de sombras. Meu corpo que tenta se recuperar do
parto, que por mais natural que tenha sido, sempre deixa marcas físicas. Meu
útero que sangra incessantemente. O bebê que mama na mesma intensidade em que eu
emagreço. E eu tentando me encontrar nessa nova rotina, na função de mãe de
dois. Aprendendo a ser mãe de um segundo filho recém-nascido, um serzinho que
exige dedicação exclusiva em um momento em que eu não posso me dedicar exclusivamente
a alguém sem me sentir culpada por estar negligenciando o mais velho.
Bom, até aqui, você que não é mãe e optou por continuar lendo,
ainda consegue entender que pode não ser um período fácil, não é? Perder sangue,
emagrecer e amamentar o tempo todo, além de ter várias noites mal dormidas pode
ser bem desagradável, certo? Certo. Mas não se trata exatamente desse tipo de
problema físico. E é a partir daqui que mães e não mães se dividem em dois
grupos.
O puerpério é morte. Morte daquela que eu fui, morte daquela
vida que eu tinha. Tudo novo, de novo. Aquela Vanessa está morta, mas ninguém vai
perceber, por isso ninguém vai chorar por essa morte, somente eu. O puerpério é
solidão. É se sentir absolutamente sozinha mesmo cercada de pessoas. O puerpério
é perder a identidade. É não se identificar mais com aquela gestante ansiosa pelo
parto, mas também não conseguir ainda se enxergar como mãe de dois filhos. Estar
no puerpério é passar dias com um choro entalado na garganta e não conseguir
encontrar um motivo digno para chorar. É não ter coragem de compartilhar sua
solitária dor com alguém por medo de ser incompreendida. Porque você sabe que
será. Afinal, você teve uma gestação tranquila, teve o parto que queria, tem um
filho perfeito, um marido companheiro, formou uma família linda. Não tem direito
de estar triste. E mesmo que você encontre uma alma que vibre na mesma sintonia
e se sinta segura para falar, você não saberá o que falar. Não há um motivo
para o choro, não nesse plano, não um motivo palpável, claro, que possa ser definido
racionalmente.
Esse é meu segundo puerpério, e como toda segunda experiência,
esta sendo mais leve. Já conheço bem o gosto amargo dos sentimentos que me
judiaram da primeira vez. Não posso dizer que somos amigos, eles ainda são
capazes de me sufocar, mas o fato de saber que eles existem dentro de mim facilita
uma convivência sem tanta resistência. E talvez essa seja a palavra chave, ao
menos pra mim: não resistir. Não tento mais vencê-lo ou ignorá-lo, me entreguei
e vivo esse momento por inteiro, por mais difícil que possa parecer. É uma fase
única de contato com as minhas mais profundas sombras e eu não quero deixar
isso passar em vão. Assim como eu escolhi
um parto sem nenhum tipo de anestesia porque eu queria sentir tudo, sentir meu
corpo, me autoconhecer, novamente eu escolho viver essa experiência sem filtros,
sem anestésicos, sem fugas. Eu quero viver intensamente este puerpério e não
somente sobreviver a ele.
“Há a velha eu partindo e a nova eu habituando-se a si mesma. E há uma forte amizade entre ambas. Muiticoexisto coesa. Há entre a velha e a nova uma gratidão enorme que amansa medos. Uma consciência que sorri para tudo o que fui. Consciência que flui em ritmo de autosororidade. A nova gentilmente aguarda o momento em que a velha se sinta pronta para ir, sem despejos. A velha sente que a nova é bem-vinda. Elas se abraçam, conectadas e belas como o brilho de uma verdade sentida e vivida com intensa profundidade." Natacha Orestes
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